Wednesday 26 August 2009

Um Amigo P'ra Você (Ha-Ha-Ha-Uh-Uh-Uh)
























Valerá a pena contar a história de um indivíduo que falhou em tudo durante a sua vida? Tenho cá as minhas dúvidas. Aliás, neste momento pondero seriamente escrever antes sobre Rosa Cheirosa, uma bem sucedida prostituta. E daí talvez não, que a minha esposa está aqui ao lado com um facalhão em tudo idêntico ao de John Rambo encostado aos meus testículos. Pelo sim, pelo não, vou antes escrever acerca deste nobre sujeito.

Nuno Hadrianno dos Santos Malpicasuru nasceu no dia 13 de Outubro de 1976 no Bombarral, filho de mãe portuguesa, pai padeiro e tio primata. Logo dois minutos após o seu nascimento já o médico reparava que o miúdo ou descendia de uma nobre linhagem macacóide ou era familiar de Zezé Camarinha. Frequentou o Jardim de Infância "Os Catitas", onde se notabilizou no bibe amarelo pela colagem de macacos em tampos de mesa e partes de baixo de lavatórios. Aí travou também amizade com Pedro Carrasco, um sujeito que lhe viria a meter nojo pelo menos por mais quinze anos. Carrasco conta que, no período em que frequentavam o ensino básico na escola EB 2,3 de Nelo Silva e Cristiana, Hadrianno começou a evidenciar os talentos que o viriam a notabilizar por não ser nada que preste. Enquanto os colegas se entretinham a rebentar balões de água cheios de ar na cabeça de outros, já Hadrianno raspava com fulgor as calosidades do pés do seu pai com pedra-pomes e coleccionava pilhas Varta descarregadas.
Os seus pais eram feirantes, mais propriamente cantelheiros, e foi desde cedo que começou a assistir àquilo que tornava o ambiente da feira algo singular, como as brigas de ciganos com outros feirantes por um lugar, os pregos no pão com mostarda rançosa e os sujeitos que anunciavam os preços de edredons com gáudio ao megafone.

Cedo despertaram os seus talentos, é certo, mas também as rivalidades. Na escola começou a sofrer impropérios por intermédio de Baboo, outro aluno primata e hirsuto que sofria de um tipo de autismo que não incluía a memorização de listas telefónicas. Uma vez andaram os dois à briga no pátio. Hadrianno empurrou Baboo, Baboo empurrou Hadrianno, Hadrianno ripostou. Baboo tropeçou e caiu, Hadrianno fugiu. Hadriano ganhou. Um tempo mais tarde, já no oitavo ano e a precisar seriamente de barbear a testa, apaixonou-se pela primeira vez. A sortuda era Susana Vanessa, conhecida pela alcunha "bicicleta da aldeia" e pelo facto de possuir uma autêntica cordilheira de borbulhas de acne na testa que convidava cegos a uma leitura interessante e convenhamos, algo cheia de pus. Susana era uma moça verdadeiramente especial e Hadrianno reparara. Pertencia-lhe ainda o recorde de mais sujeitos aviados no intervalo das dez e quinze: cinco. O Mário Reis atrás do pavilhão de Educação Física, o Carlos Jorge no anfiteatro, o Simão nas escadas do refeitório, o Marcelo atrás do Bloco A e o Pedro Cebolo no balneário.

Mas o amor platónico de Hadrianno nunca achou correspondência nas necessidades puramente carnais de Susana, que tinha preferência por rapazes praticantes de motocrosse que vestissem calças de marca Resina. Certo dia, Hadrianno participou no corta-mato escolar para impressionar Susana, mas ficou em quadragésimo-sétimo lugar, e ela só aviou os primeiros quarenta e seis. Tentou ainda, de forma vã, impressioná-la com a sua participação no campeonato distrital de Jogo do 24, mas só ganhou uma t-shirt do Chester Cheetah e nada mais. No meio de tudo isto, Hadrianno recuperou a custo. Porque se não bastassem as desilusões amorosas, ainda teve de partilhar durante três anos na aula de Físico-Químicas a carteira com o Simão, um sportinguista que tinha um dossier repleto de imagens do seu futebolista favorito, César Prates.

Enfim, foi só no décimo-primeiro, um ano depois de se ter estreado no lançamento da mini, que se apaixonou verdadeiramente por uma catraia que não era badalhoca. Passou-se isto uma vez à porta do café "O Pipas", onde ia toda a garotada da escola fazer introdução ao alcoolismo. Ali a viu. Após ter emborcado meia garrafa de Pisang Ambon e três shot's de "pastel de nata" lá estava ela, a mulher da sua vida, vomitando com grande categoria sobre as calças Sicko 19 que vestia algo que possuía um fino aroma a canela e a bílis. Nunca mais conseguiu esquecer aquele cheiro, mas se calhar devia.

Como todos os seus colegas, ou pelo menos metade, Hadrianno foi numa viagem de finalistas. Mas como não se lembra de nada que tenha acontecido nessa semana, eu também não vou escrever sobre isso. E foi para a universidade, estudar desemprego. Licenciou-se com sucesso em provas de mini preta, ginja e shot's, foi praxado por tipos com dez matrículas e metade desse valor em neurónios. Depois disso, bem, as oportunidades apareceram como por magia. Estava um domingo na feira de Santana com os seus progenitores a anunciar bugigangas quando avistou numa banca de cassetes pimba aqueles que viriam a ser os seus mentores e colegas: Ediberto Lima e Dj Pantaleão. Ediberto passou pela sua banca e ali viu um objecto que o maravilhou, um corta-unhas com a bandeira brasileira. Mas outra coisa lhe chamou a atenção, Hadrianno. Nunca Ediberto tinha visto um tipo tão peludo na sua vida, tirando Tony Ramos. E percebeu que era disto que precisava para o seu projecto televisivo depois de "Muita Lôco":
"Aí meu chapa, cê já feiz televisão?"
Hadrianno não sabia bem o que responder. Talvez a verdade fosse o ideal.
"Népia bacano. Mas porquê?"
"Preciso de um cara como ócê pa pôr numa jaula no meu programa e dar porrada em quem lá aparecer cantando mal. Pago bem. Dez contos por mêis".
"Tá".

Hadrianno aceitou o convite. Aliás, na sua condição não podia ter feito outra coisa - era bom demais para recusar. Estar três horas aos sábados à noite a dançar dentro de uma jaula ao som de música pimba era o sonho de qualquer descendente de cantelheiro. Ali conheceu a mulher com quem viria a casar, Maria Grovetka, uma emigrante de leste que usava as cuecas pelo umbigo. Emídio Rangel foi seu padrinho de casamento, e deu-lhe um calduço nesse dia. Teve dois filhos, nenhum deles um prodígio em beleza física. Viria a falecer em Maio de 2005, vítima de programa do Goucha. Não ressuscitou, o que já de si foi bom.

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